domingo, 23 de outubro de 2011

Resposta a Arnaldo Jabor

Li o artigo de Arnaldo Jabor (http://pensador.uol.com.br/arnaldo_jabor_infidelidade_masculina/) e fiquei, no mínimo, surpresa. Sempre admirei suas opiniões, as quais conciliam crítica, bom humor e sensatez. E, na grande maioria das vezes, ao término de cada uma delas, enchia os meus pulmões e exclamava: esse é o cara!

Entretanto, essa não foi a minha atitude ao ler o referido texto. Apesar de ser cristã, minha pretensão não é refutar as razões do jornalista com argumentos proselitistas. Tampouco duvidar da veracidade do comportamento humano descrito no artigo. Minha indignação encontra-se na maneira pela qual o ilustre escritor demonstra conformismo diante de um comportamento medíocre: a infidelidade.

Novamente ressalto que não quero cair na retórica maniqueísta dos padrões morais (que existem sim no Cristianismo, porém não como um fim, mas como produto de um estilo de vida); na verdade pretendo analisar as possíveis consequências desse comportamento.

Antes disso, gostaria de fazer-se perceber como o texto é explicitamente (e vergonhosamente) machista. E, de forma muito repulsiva, nota-se a tentativa de construir um simulacro de conselho (“não fique desencantada com a vida por isso”; “se você busca o homem perfeito, pode continuar vendo novela das seis”; “espero ter ajudado em alguma coisa”).

E ainda: para sustentar sua opinião, o escritor justifica esse comportamento, considerado convencionalmente imoral, até pelo viés – pasmem – científico (?!). Não estou pondo à prova as comprovações do autor. Só acho lastimável o seu conformismo e seus argumentos que, como tentáculos, se estendem por todos os campos possíveis, sufocando a possibilidade de se pensar numa outra solução para o problema. Isso é surpreendente quando vem de um jornalista tão renomado, destacado justamente pelo uso da crítica diante de tantas outras circunstâncias inadmissíveis (a impunidade na política é um exemplo), as quais geralmente permanecem em grande estilo, sustentadas pela inércia do conformismo.

É fato que homens e mulheres são diferentes e que estamos em pleno século XXI (o que, conforme Jabor, torna totalmente descartáveis os conselhos de nossos avós). Mas há questões que são universais e atemporais: fidelidade não se limita a mero comportamento; diz respeito ao caráter. E vou além: por que a infidelidade em um relacionamento amoroso é conciliável e a infidelidade na política ( como no caso de desvio do dinheiro público) não? É o mesmo princípio. É o mesmo comportamento.

“Ah, mas você já está radicalizando. Afinal, o princípio da fidelidade é relativo!” ( como muita coisa na vida, infelizmente). Tudo bem. Vou permanecer no que tange aos relacionamentos amorosos. Então, temos que aceitar que a infidelidade é o que mantém o casamento vivo. É a forma do homem sentir-se realizado, útil e atraente. A mulher... bom, a mulher não precisa dessa exclusividade toda. É muito egoísmo por parte dela. É falta de compreensão. E os filhos? Os filhos não têm que interferir na minha vida. É só manter segredo. E se descobrirem, um dia entenderão. É simples! É prático! Tudo fica sob controle.

Todavia, quando a infidelidade é descoberta, as consequências fogem da alçada humana. Até onde sei, o ser humano não vem com um manual de programação, no qual a possibilidade de escolher “não sofra”, “não traumatize” e “esqueça” pode ser ativada a qualquer momento. Famílias destruídas, crianças inseguras e confusas, além da possibilidade de transmissão de DST, gravidez indesejada e abortos, devido à promiscuidade, fazem parte do cenário desse capricho: a infidelidade.

E ainda: deve-se levar em conta o dinheiro público que é gasto nas campanhas do governo para prevenção dessas doenças e com os internamentos em hospitais por realização de um aborto. É paradoxal investir em campanhas de conscientização e, ao mesmo tempo, banalizar a infidelidade, a qual também é responsável pelos problemas citados.

“Ah, mas quanta ignorância! Vou me prevenir com preservativos!”. Oh, perdão por subestimar sua inteligência. Fiquemos então somente com as famílias destruídas e com as crianças inseguras e confusas, que já está de bom tamanho. Já é o suficiente para bastante dor de cabeça: pensão, terapia e todas as implicações que uma separação pode oferecer, tudo por causa de um hedonismo desenfreado.

A fidelidade é um princípio que deve ser aplicado em todos os ramos da nossa vida. É um grande erro (na verdade, é uma ilusão) acreditar que é possível relativizar a fidelidade. Não há como ser fiel nos negócios quando não se é nos relacionamentos. Fidelidade está intimamente ligada com honestidade. Ambos dizem respeito ao caráter. E este sim é radical: ou se tem, ou não se tem.

Não sou uma ativista feminista. Conservadora? Talvez. Se valorizar o respeito ao ser humano for conservadorismo, sim. Mas guardo dentro de mim uma ânsia revolucionária: a de não me conformar com a infidelidade e tentar, na medida do possível, influenciar e transformar a realidade, papel dos formadores de opinião, como Arnaldo Jabor, o qual neste caso, não foi capaz de fazer (talvez não quis).

Silvia C. Gonçalves